Reflexão episcopal para o tempo da Quaresma
Primeiro
Domingo da Quaresma 2013
Lucas
4: 1-13
Rev. Bispo
Ken Martin
Dos
bancos das salas de aula nos seminários, os cristãos de hoje
aproveitam para debater se o diabo é real ou só um mito da
Antiguidade. Algumas das imagens populares desse personagem, a partir
da Flip Wilson: “O diabo me fez inventá-lo” até à onipresente
figura produto da publicidade e da cultura, vestida de vermelho,
tridente na mão, cauda bifurcada, lançando enxofre pela boca que
vende de tudo, incluindo carne enlatada, trivializam e obscurecem a
luta de Jesus no deserto.
No
que creio... Como quer que chame, é uma realidade do mal: uma
realidade que despreza a Deus e a tudo que é bom, amoroso e justo.
Acredito porque o encarei e creio porque não sei de que outra
maneira explicar o mundo em que vivemos.
No
texto de hoje, a palavra “diabolos” é traduzida como diabo.
Literalmente significa o “separador”; algo que separa o que não
deve ser separado; algo que quebra aquilo que deve permanecer; algo
que fragmenta o que deve permanecer unido; algo que destrói o que
deve permanecer íntegro.
Seguramente
tem sentido, tratando de te separar do que você sabe (ou não?).
Seguramente conhece como tenta afastar da pessoa que Deus quis que
fosse (ou não?). Isso é exatamente o que ele tentava fazer com
Jesus no deserto. Quase podemos escutar sua orquestração: “Vamos
ver, Jesus, se podemos encontrar uma maneira que te impeça de fazer
o que Deus te enviou a fazer aqui.” Isso é o que chamamos de
tentação.
No
livro Quando
Deus vem,
o sacerdote episcopal Gary Temple relata:
“No
sábado, antes de pregar sobre os versículos que se referem ao
diabo, estava frustrado em meu quarto refletindo, pois não entendia
muito bem a referência. Então, sem dar muita importância às
consequências, perguntei a Jesus, ‘Do que trata o assunto do
diabo? ’”. Imediatamente, me senti revestido pelo amor de Deus,
como se um bálsamo refrescante se derramasse sobre mim; como se
estivessem me abraçando por trás. Ao mesmo tempo, a atmosfera em
minha frente parecia se abrir como uma cortina, revelando um vazio
escuro e atroz. Ao vê-lo, me dei conta de que algo vivo se escondia
em seu interior. A malignidade no fundo da fossa era enorme, maior
que o mesmo sistema solar e cheio de um ódio fervente, em nada
parecido ao que experimentei na Terra.
Esse
extremo ódio impotente se dirige a Deus. Somos de pouco interesse
para ele, exceto que ao nos provocar danos podiam causar incômodos a
Deus. Minha reação inicial foi de um terror abjeto, como um coelho
encurralado por um gato montanhês. Mas consegui chegar ao fundo do
meu medo e descobri uma tristeza mais profunda do que jamais havia
conhecido. Cortou-me o coração que um universo tão formoso como o
nosso deve conter algo tão absolutamente repugnante. Falei com Deus
outra vez, tentando articular uma visão que me foi dada.
“Tua
morte na cruz foi para romper esse poder? Era para atirá-lo no
abismo? E se atrevera a lançar sua melhor jogada contra ti?”
“Sim”,
respondeu.
“Em
sua morte na cruz, estava vendo isso sobre seus ombros, concorda?”
“Sim”.
Foi
a este Espírito de Separação, esse mal que deprecia a Deus e ao
que é bom ao que Jesus fez no deserto. Parece estranho que Deus
dirija a Jesus à tentação em lugar de livrá-lo dela. Mas essa
palavra tem dois significados: tentar e provar. E aqui pode estar a
diferença: tentar é convidar a fazer o que é incorreto, provar é
dar a oportunidade de fazer o correto. Tentar é confiar no fracasso,
provar é confiar no sucesso.
Por
isso, sugiro que essa experiência possa ser um dom. As pessoas são
como o aço. Não sabemos de que somos feitos até sermos provados.
Cada tentação é uma via de mão dupla... É uma oportunidade para
subir ou descer, para ir adiante ou retroceder. Deus tenta provar a
Jesus, mas como sempre, havia outros no caminho. Por isso, é preciso
esperar o fim da jornada para saber o resultado.
Estas
foram as provas de Jesus, que não são necessariamente as nossas. As
suas formam primeiro fome física; logo fazer que Deus se mostrasse a
si mesmo por meio de milagres; depois ceder ao desejo de ter tudo,
ignorando o caminho que Deus estabelece para ele. Mesmo que essas não
sejam as nossas provas, podemos nos identificar com elas, não é
verdade? Aqui, a maneira que pode se apresentar em nossas vidas:
primeiro, confiamos que Deus proverá todas as nossas necessidades?;
logo, nossa fé é suficientemente forte para sobreviver inclusive
sem provas?; e por último, aceitamos e celebramos o caminho que Deus
nos tem dado em vida ou pretendemos ser outra pessoa porque ser o que
criou Deus nos parece uma alternativa muito difícil?
Estas
foram as provas que confrontou Jesus porque eram coisa que
possivelmente podiam separá-lo de Deus e da vontade divina para a
sua vida. Cabe a nós, discernir as situações que nos põem à
prova em nossas vidas.
O
Separador disse a Jesus,” Você não tem que ser a pessoa que Deus
quer que seja. É muito difícil e existe um caminho mais fácil.”
Porém Jesus o responde, “Serei quem Deus me pede que seja e farei
o que me pede que faça.”
Que
maneira maravilhosa de começar esse período: fazer um inventário
espiritual pessoal... Observando com honestidade, como fez Jesus, as
situações que provam nosso compromisso em viver autenticamente –
e como Jesus – renovar o compromisso de ser exatamente e somente a
pessoa que fomos criados para ser.
Tradução:
Handré Garcia
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